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segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Tortura psicológica

 Tortura psicológica

 
 


 
Por Gisele Brito gisele.brito@folhauniversal.com.br O ditado popular ensina que o trabalho enobrece o homem. Mas, para muitos trabalhadores, o ambiente que deveria garantir dignidade torna-se o cenário de humilhações tão constantes e avassaladoras que alguns desenvolvem doenças, distúrbios, se tornam agressivos com a própria família e chegam até a tentar o suicídio. Apenas no estado do Rio de Janeiro, entre 2004 e 2008, o número de investigações por assédio moral – a exposição repetitiva e prolongada do trabalhador a constrangimentos e humilhações por parte de seus superiores – passou de 17 para 117. Até o mês de agosto deste ano, já são 90 investigações. Em São Paulo, são outras 128. Esses números apenas refletem aqueles trabalhadores que superaram o medo e levaram seus casos à Justiça. A realidade em escritórios, lojas e fábricas, ocultada pelo temor da perda do emprego, é ainda pior. Insultos, desqualificação das competências do funcionário, colocar em dúvida a veracidade de atestados médicos, controle de idas ao banheiro são as formas mais comuns do assédio. “O assédio é uma perseguição. É normal que o chefe peça para o funcionário repetir um trabalho que não ficou bem feito, mas fazer isso 10, 20, 30 vezes caracteriza a perseguição”, explica o Procurador do Ministério Público do Trabalho, Wilson Prudente. não é um fenômeno novo, mas com as reestruturações econômicas que levaram as empresas a diminuir os quadros de funcionários, sobrecarregando os empregados que ficam, o problema se intensificou. A médica Margarida Barreto foi uma das primeiras a pesquisar o assunto, em 2000. De lá para cá a exposição do tema na mídia tem sido um dos principais motivos para que os trabalhadores busquem ajuda. “A primeira coisa para se resolver esse problema é saber que não é natural ser humilhado no ambiente de trabalho”, aponta a médica. O despreparo de funcionários em cargos de chefia e a tentativa de induzir o trabalhador a pedir demissão são os principais motivos que levam ao assédio. “Há também toda uma política de gestão, que faz com que as coisas tenham que ser feitas a qualquer custo. O medo acaba sendo uma ferramenta de terror”, explica a médica.lógicaPara Luciano de Oliveira, de 28 anos, as perseguições chegaram a tal ponto que, depois de pouco mais de 1 ano atuando em uma indústria química, ele desencadeou uma esquizofrenia. “Aonde eu ia os encarregados iam atrás para me vigiar. Depois me isolavam. Eles diziam para os outros funcionários não ficarem perto de mim. Soltaram o boato que eu bebia, sendo que nem de bebida eu gosto”, conta. As perseguições que levaram Luciano a pensar em suicídio começaram quando ele passou a apontar falhas nas normas de segurança da empresa e, apoiado pelos colegas, foi eleito para a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa), o que lhe deu estabilidade no emprego. “Meu encarregado destacou um funcionário só para colocar medo em mim. Fiquei com medo, não sabia mais quem era meu amigo ou estava a mando da empresa”, relata. “As pessoas têm tanto medo, não sabem nem que elas são as vítimas. Elas não falam nada. O resultado é que depois ficam doentes e não conseguem mais trabalhar. A maioria das pessoas que conheço, que pediram as contas, depois não arrumam outro trabalho porque na hora de fazer os testes psicológicos na outra empresa não passam”, conta Maria Silva*, de 43 anos. Ela trabalhava em uma empresa farmacêutica e começou a desenvolver vários distúrbios depois que uma encarregada passou a persegui-la. “Ela fazia de tudo para me humilhar. Me pedia para fazer coisas que eu não era remunerada para fazer. Por ser subordinada, tinha que obedecer. Eu deitava para dormir e não descansava. Parecia que tinha levado uma surra”, finaliza.

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